Na edição nº 900, referente à
semana de 08 a 14 de outubro, o jornal Novo Horizonte traz na editoria Igreja
uma notícia intitulada “Igreja celebra Semana da Vida e Dia do Nascituro” que
trata sobre a Semana Nacional da Vida que a Igreja Católica celebrou de 01 a 07
de outubro e no dia 8 a celebração do Dia do Nascituro.
No lead (primeiro parágrafo que sintetiza o fato) da matéria, o autor
escreve: “A data é incentivada pela Conferência Nacional dos Bispos Brasil,
CNBB, desde a 43º Assembleia Geral da Conferência dos Bispos do Brasil,
realizada em Itaici, de agosto de 2005”. Primeiro que foram celebradas duas
datas distintas: de 01 a 07 – Semana Nacional da Vida e no dia 08 – Dia do
Nascituro – mas quando o autor cita “A data...”, ele não especifica ao leitor
qual das celebrações é incentivada pela CNBB. Outro fator é que ele não nos situa
quanto a localidade Itaici, já que não explicita que se trata de um bairro na
cidade de Indaiatuba, no estado de São Paulo.
É importante atentarmo-nos para
partes da narrativa. No 3º parágrafo
consta: “A proposta da CNBB é a defesa da dignidade, da humanidade, e da
originalidade do embrião, do feto, do nascituro. A Pastoral Familiar
complementa este trabalho com a luta pela ecologia, pelos pobres, contra a fome,
pela inclusão social, contra as injustiças e desigualdades.” E no 4º parágrafo:
“A defesa do nascituro sustenta-se na valorização do ser humano que está no
ventre materno e que a Mãe precisa dar a luz...”.
Lendo os trechos não parece
constar nada de errado para quem está acostumado com esta visão hegemônica
sobre o tema. Até porque se trata de uma atitude que todos sempre admiram, ou
seja, a ajuda ao próximo, a luta pela defesa de algo ou alguém - e que seja de
interesse da maioria. Mas o outro lado da questão é que ninguém percebe como
essa ideia é imposta à população, ou melhor, quando se diz que a “Pastoral
Familiar luta pelos pobres, pela inclusão social, contra as injustiças e
desigualdades”, há neste trecho uma contradição, pois se este é o papel que o
grupo diz desenvolver na sociedade. Contudo, porque eles não defendem o ponto
de vista de que estes pobres, principalmente as mulheres, não possuem as
condições necessárias de conceberem uma vida e que, com isso, deveriam deixá-las
terem o livre-arbítrio de escolherem se querem ou não uma criança. Mas não, o
que a Igreja faz? Simples, condena esse outro ponto de vista e aponta todas as
mulheres que cometem o aborto como pecadoras e criminosas.
Poderia ser diferente
Como já foi dito na seção de artigos
no ensaio intitulado “Aborto: legalizar não é incentivar!” -
http://observandoparintins.blogspot.com/p/artigos.html
- não é o simples fato de não querer ter uma criança que deve estar na balança
desse debate, o que deve ser analisado é todo um contexto social em que a
mulher está inserida – o que impediria de realizar um julgamento tão prematuro.
O outro ponto polêmico é quando
expõe: “A defesa do nascituro sustenta-se na valorização do ser humano que está
no ventre materno e que a Mãe precisa dar a luz...”. Por que necessariamente
ela precisa dar a luz? E se ela não quiser ou puder ter? Cadê o direito de escolha
dessa mulher? Por que os jornalistas não questionam isso e apresentam um real
debate sobre essa questão?
Uma alternativa a ser trabalhada
na cobertura do aborto poderia ser a seguinte: Abortar é uma questão não só de direitos humanos, mas de criação de
políticas públicas de saúde, e é isso que falta ser questionado e debatido pelo
jornalismo desse Sistema de Comunicação.
O que o veículo deve perceber é que embora a Igreja pregue que tem que
haver a luta a favor da vida, o cenário em Parintins, assim como em todo o
Brasil, a cada dia se torna caótico em relação à saúde, pois não se tem, nem se
pensa, em políticas públicas para dar o apoio que as mulheres realmente necessitam.
Além disso, o município é uma sociedade dominada pelos poderes da Igreja
Católica, instituição que defende a bandeira da vida, mas condena o uso de métodos
contraceptivos, já um tabu vivenciado na sociedade parintinense.
Enfim, Parintins não foge desta
realidade, a questão dos direitos reprodutivos da mulher é um assunto que a
população tem o direito de ter acesso e acima de tudo respostas o mais rápido
possível, a fim de poderem ter a esperança de que esta cidade possa chegar a
ser um dia, verdadeiramente, um dos melhores lugares para se viver no norte do
país.
Hanne Caldas